28/11/2008

I had one

Sonhei, na noite que virava o dia 22 pra 23 de Novembro.

Era um pequeno salão cujo chão eram tábuas de madeira. E uma dúzia de bancadas de madeira do lado esquerdo da sala, onde me encontrava com Carol, num dos bancos mais traseiros. E uma dúzia de bancadas do lado direito, onde, um pouco mais à frente, estavam Cadu e Zenaide; e Zenaide também usava dreads.

Osmar consultava algo que se assemelhava a um livro ou caderneta, e sentava nas bancadas do lado esquerdo, um pouco adiante de mim e Carol.

Na frente da sala havia um pequeno tablado, onde estavam dispostos instrumentos musicais, todos vazios, em posição de descanso.

O chão, as paredes em toda a sua textura, o teto, o pé direito, tudo na sala lembrava uma sala de aula do Colégio Batista Shepard, onde estudei por toda a minha infância.

E, fora eu, Carol, Cadu, Zenaide e Osmar, toda platéia era formada pelo estereótipo do tijucano médio, masculino e feminino. E se percebia mais presenças por algum glamour que por um engajamento propriamente dito.

E não havendo apresentações musicais, era um recital de poemas que havia. E havia um bandolim ou cavaquinho acompanhando sozinho Osmar numa récita de uma obra de sua autoria.

Esse poema invertia metáforas e outras figuras usuais para, implicitamente, questionar a utilização do branco para paz, harmonia, sabedoria e conhecimento; e do preto para esses antônimos. E a proposta era de abolição, confusão desses instrumentos. E o instrumentista o acompanhava.

E de volta à platéia, percebíamos reações díspares. Um casal dormia, ou fingia. E uma menina recitava de cor, no mesmo ritmo do poeta, os versos de um poema que só não era inédito para o poeta.

E ao fim, percebemos alguma comoção das pessoas, mas também alguma ridicularização.

E nesse momento, Cadu, do seu lugar, intempestivamente, toma a palavra, esbravejando e batendo com a ponta dos dez dedos em seu próprio peito. Quando ouvimos prontamente, e também em alto e bom som, algumas palavras de Zenaide em apoio a Cadu, que dizia as suas em apoio às de Osmar.

Então, mais calmo e não menos incisivo, Cadu se levanta e se posta ao fundo da sala, e todos tem que se virar para enxergá-lo. E dessa inversão de posições o poema já falara. E ali, Cadu começa um discurso sobre a importância e beleza do negro através da história escrita e não-escrita da humanidade.

De repente, toda a platéia se levanta e se coloca em círculo, vejam bem: todos em pé e em círculo, ouvindo e vendo Cadu falar e gesticular. E se observava que Zenaide, como os demais, em respeito à fala de Cadu, nada falava. Mas diferentemente de todos, concordava com ele em gestos. E interessante foi, quando Cadu a falar de arte, religião e dança, esboçou uns passos, e Zenaide foi a lhe acompanhar.

E, ao final, foram ouvidos aplausos efusivos

E eu, que nesse momento já misturava ao sonho o que era real, me encontrava deitado e levantei para aplaudir.

Não lembro um só verso do poema, nem um só palavra do discurso, mas sei exatamente do que se tratava: da importância da parte negra para o todo humano.

E esse foi o sonho, não sei se Freud ou Daniel explicariam, mas só sei que foi assim.

7 comentários:

Anônimo disse...

Adorei!
Não quero comentar seu sonho, só agradecer por ter compartilhado.

Anônimo disse...

vou me deitar agora, pra ver isso tudo de mais perto...e pra manter os contrastes, deitarei esta carne negra que me cobre a alma escura, nesta manhã clara e outonal....

Anônimo disse...

Só posso dizer no melhor dos dizeres é que, de fato, a parte negra é essencial. Do que seria o dia sem a noite, ou a junção de todas as cores se não houvesse a possibilidade da ausência das mesmas... A comunidade mestiça agradece também. E se não fosse por nossos colegas africanos as grandes potências ficariam sem opção de exploração. E dá pena, né??

Anônimo disse...

P.s.: Como vc não tem mais orkut preciso perguntar se vc já ouviu falar em Olavo de Carvalho e sua opinião sobre ele. Pode rolar um email mesmo... thati.ildefonso@gmail.com
bj

abstrato de tomate disse...

Tathy.

já vi algo desse tal de Olavo de Carvalho. E tudo o que posso dizer é que detesto. Sei nada das teorias que ele pratica. Mas sei que ele é arrogante e metido. Se acha o primeiro filósofo depois de Sócrates. E parece que anda do lado de gente da estirpe de Reinaldo Azevedo, e outras figuras que escrevem colunas, pasmem!, na Veja. E parece que quem lê e admira esse tal de Olavo de Carvalho, a quem eu particularmente denomino "olavetes", são uns tais reacionários que se chamam "neocons", ou alguma piada do tipo. Uma figuraça em filosofia no Brasil que já me ajudou um bocado é a Marilena Chauí, da USP, tem uns livros interessantes de Introdução, e parece que o foco dela é Espinosa (filosofo preferido do Einstein). Mas não sei bem o que vc está buscando no Olavo, parece que ele fala muito de Aristóteles, aí, é bem melhor vc ler o Aristóteles mesmo, ou "História do Pensamento Ocidental" do B.Russell. Mas a gente conversa mais sobre isso. bjos

Osmar Filho disse...

Só sei que não havia noite na Terra Grande e Uiara mandou trazer a noite. O moço branco foi lá na África e trouxe a noite pra Terra Grande, pq o Sol olhava os filhos da Uiara fazerem saliência por entre as folhas.

(Adaptado, muito adaptado de Martim Cererê, de Cassiano Ricardo)

Anônimo disse...

Só agora pude ler seu sonho, rico em detalhes e muito interesante.
Fiquei feliz ao ver que os participantes do mesmo também puderam ter esta alegria.

Bjus.