13/05/2010

Manejos

Prometeu rouba o fogo de Vulcano e o entrega aos humanos - autoria desconhecida

Penso que é a mão que nos faz humanos.

Há uma forte simbiose entre a mão e o cérebro. Pois o manuseio exige um cébebro maior, mais evoluído, com cortexes mais robustos, com redes neurais mais intricadas. Mas o uso permanente das mãos exige o bipedismo, e este permite uma estruturação anatômica mais satisfatória para uma cabeça maior e um cérebro mais volumoso.

O fato é que tais manobras nos tornaram mais inteligentes, mais hábeis, mais sapiens

Naõ por acaso a importância da ferramenta nas mitologias e o motivo por que muito deuses portavam instrumentos. Sejam machados, martelos, espadas, escudos, arcos, lanças, flechas, espelhos, penas, livros, mouses, teclados, pilões, arados, rédeas, cruzes, bússolas, esquadros, compassos, relógios, agulhas, pregos, teares...

A mão faz o homem, o instrumento faz o artífice.

Mas mesmo assim o trabalho braçal nem sempre recolheu prestígios. Um torneiro mecânico como Presidente da República é algo que ainda porvoca certos comichões. A Grécia de Aristóteles, como outras aristocracias, via o trabalho manual como coisa para não mais que macacos. Ao intelectual bastava a reflexão, esta, talvez, bem ao estilo narcisista. Mas, fora isso, somos sabedores que o pensamento e a manipulação sempre dialogaram, a tão famosa binomia teoria-prática não pode ser melhor imaginada.

E assim como o homo erectus libertou o homo habilis, este, provelmente precedeu o homo loquens, e como certeza o sapiens sapiens .

Mais altaneiro, mais hábil e mais inteligente, o homem começou a tecer seus discursos, a explicar seu universo. E dentre todas as ferramentas eu gosto de crer que a tocha é a que merece maior destaque, pois o domínio do fogo, fato narrado com muito interesse pelas mitologias, foi crucial em nossa caminhada.

Não por acaso a sua luz representa o conhecimento.

E uma teoria arqueo-antropológica que vem sendo bastante discutida é a de que o fato de o homem ter passado a cozer ser alimentos, lhe deu um maior saldo energético nas refeições, uma vez que o alimento cozido requer bem menos gasto energético para a disgestão do que o alimento cru, não sei o que Levi-Strauss acharia disso. Mas assim sendo, mais energia sobrava para esse cérebro mais potente. E na medida que permitia o aumento da cérebro, permitia a diminuição do estômago, o que, anatomicamente, também foi muito interessante para a manutenção do bipedismo.

Sabemos agora a importância das panelas, e perguntamos: serão um dia os robôs tão bons cozinheiros.

E como bem disse Drummond: "Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas"

E como deuses criaram homens, com as mãos a modelar o barro, segue um belo exemplo de manuseio.

A Canção do Oleiro - Osmar Soares

I

Teu corpo macio
me convida a modelar o vaso.

Quando se assumirá
a forma final do meu amor?

(Das tuas palavras
não guardo recado)

A canção do oleiro
se dá no ritmo dos meus braços

Só minhas mãos
conhecem a rima da tua dor.

II

Teu corpo macio
me convida a modelar o teu desejo

Mas quando se assumiu
a forma final do teu desprezo?

Sobre a ola triste
gira triste o sonho do oleiro.

(Na minha voz
levo temor guardado)

Sobre a ola triste,
gira triste o sonho do amor.

Quando se dará
a forma final do meu recado?

Mas quando se dará
a forma final do meu amor?

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